Fotos: Daryan Dorneles
Tal qual um sumo pontíficie do metal, Ozzy Osboune comandou uma celebração de fé na música pesada; aos 59 anos, continua mostrando grande vitalidade sobre o palco
Enganaram-se aqueles que esperavam encontrar um Ozzy Osboune nas últimas no show de ontem, no Rioarena. Ou ainda os que decidiram ir até aos cafundós da cidade com medo de esta ser a última vez do grande criador do heavy metal no Brasil. Porque o que não faltou a Ozzy ontem, prestes a completar 60 primaveras, foi vitalidade e disposição para agitar o público, do que resulta um show vibrante e cheio de emoção, de parte a parte. O repertório consagrado, a excelente banda, a boa qualidade de som do local e cerca de 15 mil pessoas completaram uma noite perfeita em todos os sentidos. Para quem esqueceu das estripulias que Ozzy já há anos simula em hilárias montagens em que ele aparece em séries de TV, filmes e outros lugares comuns, um novo vídeo esquentou o início do show. Nele Ozzy aparece vestido de mulher, oferece vibradores a personagens, defeca num escritório e faz sexo oral com a rainha Inglaterra, em cena do filme “A Rainha”, tudo engraçado demais para ser levado a sério. Quando Ozzy surge de abraços abertos caminhando pelo palco, sua imagem faz lembrar a da primeira aparição de Bento XVI após ser escolhido Papa. Ozzy, o papa do metal, está pronto para mais uma celebração.
As expressões impagáveis de
Ozzy garantem o espetáculo
O começo com “I Don’t Wanna Stop”, do último disco, era óbvio e serviu apenas para aquecer o público para a loucura que seria o clássico “Bark At The Moon”. A banda, formada por Zakk Wylde (guitarra, o mesmo do Black Label Society), Rob “Blasko” Nicholson (visualmente um clone de Wylde, baixo), Adam Wakeman (o filho do homem, teclados) e Mike Bordin (aquele mesmo que fez fama junto ao Faith No More, bateria) é muito boa, toca com grande desenvoltura e faz um pano de fundo para a voz de Ozzy, praticamente impecável. Em “Suicide Solution”, que nunca é uma certeza no repertório, Zakk Wylde mandou um solo prolongado, numa versão bem diferenciada, enquanto Ozzy se livrava de um lenço dobrado que lhe prendia os cabelos e iniciava o lançamento de baldes d’água para a platéia – dessa vez o canhão não foi instalado, como em 1995, da última vez em que Ozzy esteve no Rio. Ao terminar “War Pigs”, Ozzy se desculpa por ter demorado tanto a voltar e promete que isso não vai se repetir. A música, atualíssima, tem como companhia imagens de guerra no telão no fundo do palco. Nas apresentações de músicas do Black Sabbath (ainda foram tocadas “Iron Man” e “Paranoid”) a banda parece tocar com mais vontade, como se a música em si, por questões históricas, os motivasse.
Ozzy incluiu três músicas do
Black Sabbath no repertório,
mas o público queria mais
Ozzy reaparece remetendo ao Papa e fazendo caras e bocas na excepcional “Mr. Crowley”, em que pese a introdução de teclado lembrar um órgão de uma igreja cristã. Em “Road to Nowhere” a banda é apresentada e explode na platéia os gritos de “olê, olê, olê, olê, Ozzê, Ozzê”, num bailado vocal que emociona o Madman. Ele “dá permissão” para que todos enlouqueçam, e é o que acontece em “Crazy Train”, o primeiro grande sucesso da carreira solo de Ozzy. Enquanto ele vai descansar no backstage, Zakk faz um solo de uns dez minutos, com direito a dentadas nas cordas e guitarra nas costas, mas nada de tão inspirado assim, e que serve mais como descanso para o público. A espetacular “Iron Man” ergue os punhos cerrados de todos, numa ode a um dos melhores riffs já criados na história do rock. Pena a música ter sido emendada, antes do fim, com “I Don’t Know”, quando Ozzy se apropria de um par de chifrinhos piscantes lançados pela platéia e remete à Angus Young, do AC/DC. Em “No More Tears”, a sensacional balada que deu novos rumos à carreira de Ozzy, nem uma ligeira falha no baixo que irrita Ozzy diminui a intensidade do show. No solo que pavimentou a carreira de Wylde, o público, enfim, como o Mestre pedira, enlouquece de verdade, em mais um momento de forte emoção. O set termina com “I Don’t Want to Change The World”, com quase duas horas, e fica a sensação de que Ozzy exagerou na inclusão de baladas, abrindo mão de músicas que poderiam ter satisfeito mais o público – caso de “Perry Manson”, “Over The Mountain”, e “The Ultimate Sin”, entre outras, ou mais coisas do Black Sabbath.
Zakk Wylde saiu do Rio com uma guitarra a
menos
“Mama, I’m Coming Home”, entretanto, no início do bis, encontra um Ozzy dramático e soa como uma canção de redenção, do encontro de um grande artista com seu público, judiado há 13 anos. “Paranoid” foi escalada para o grande final – em 1995 ela abriu – e o público detonou geral, chegando a abrir rodas de pogo típicas do hardcore. O espetáculo só não foi melhor porque Zakk Wylde, como de hábito, lançou uma guitarra ao público, na esperança de tê-la de volta. O fato causou tumulto generalizado na beira do palco, envolvendo público e seguranças, e deixou metade da música só com baixo e bateria. Recuperada a guitarra, toda espatifada, o show terminou com o tradicional agradecimento, sendo Zakk Wylde o único, no meio de toda aquela gente, a sair dali fulo da vida. Repertório:
1- Intro
2- I Don’t Wanna Stop
3- Bark At The Moon
4- Suicide Solution
5- Mr. Crowley
6- Not Going Away
7- War Pigs
8- Road to Nowhere
9- Crazy Train
10- Guitar solo
11- Iron Man / I Don’t Know
12- No More Tears
13- Here For You
14- I Don’t Want to Change the World
Bis
15- Mama, I’m Coming Home
16- Paranoid
Abertura
BLACK LABEL SOCIETY FAZ SHOW COMPETENTE, MAS KORN, BUROCRÁTICO, DECEPCIONA
Todas as músicas do Black
Label Society foram
aditivadas com solos e riffs
Para os que chegaram cedo e ainda não haviam se dado conta, o Black Label Society é, essencialmente, uma banda de guitarras, e depois da longa introdução a abertura do show é praticamente um solo, que deságua na boa “New Religion”, uma das melhores de “Shot To Hell”, o mais recente e melhor disco da banda. O som ainda está ruim, e oscila muito entre uma música e outra, mas Zakk Wylde pouco se importa e emenda uma série de rockões bem porrada, quase todos em versões aditivadas com solos e riffs repetidos. Em “Suffering Overdue”, por exemplo, ele empunha a guitarra à frente do palco e parece mesmo possesso. Zakk vai ainda mais longe em “Concrete Jungle”, outra do disco novo, quando sola com os dentes e com a guitarra nas costas. Em “Fire it Up”, que tem um refrão mais acessível, chama a participação do público, que era ainda pequeno, mas conhecedor do grupo. No final, depois de debulhar uma guitarra Flying V na zeppeliana “Stillborn”, a levanta em sinal de vitória e agradece ao público. Apenas oito músicas foram tocadas em cerca de 45 minutos de show, e “In This River”, aquela baladinha que homenageia Dimebag Darrel, foi a grande ausência, numa apresentação compacta e competente.
Jonathan Davies foi o mais esforçado do Korn,
numa noite desastrosa
O Korn acabou sendo a grande decepção da noite. Vitimado por uma qualidade de som pífia que deixou tudo embolado, e pelo constante preconceito que o nu-metal sofre por estas plagas, o grupo, de seu lado, também pouco se esforçou para superar as dificuldades. O baixista Fieldy – magérrimo, quase irreconhecível – e o guitarrista Munky pareciam cumprir uma reles tarefa profissional com a banda, enquanto Jonathan Davies tentava agitar o público, mas sua voz fraquejou em algumas vezes, quando o percussionista Kalen Chase salvava a pátria. Ele é um dos quatro integrantes convidados para completar o agora trio, depois que o guitarrista Head trocou a banda pela fé, e o baterista David Silveria entrou de férias. São eles o guitarrista Shane Gibson, discreto, no escuro do palco, o baterista Ray Luzier, bastante técnico, parecia o melhor dos músicos, e o tecladista Zac Baird, além do oxigenado Chase. Para se ter uma idéia, o Korn só se fez notar na hora em que encaixou o refrão de “We Will Rock You”, do Queen, em “Coming Undone”, tal era a embolação do som. Algumas músicas também mexeram com o público, como “Freak On a Leash”, “Faget” e “Got The Life”. Ente as novas, “Starting Over” e “Evolution” foras as únicas reconhecidas e que fizeram diferença perto do antigo repertório. Em uma hora de show o Korn não justificou sua escalação para o evento, nem proporcionou o espetáculo que os fás cariocas esperaram por tanto tempo. O grupo já fez apresentações bem melhores em outras épocas, e positivamente não passa por boa fase. Hora mesmo priorizar as carreiras solo.