Texto originalmente publicado no site da Diginet
Sexta à noite. Uma noite qualquer. Aparentemente. Um convite que vinha há meses foi aceito. Um chorinho próximo a praça Padre João Maria.
O negócio começa cedo, 18h. Chegamos às 21h mais ou menos. Tudo estava cheio de gente em pé, sentada, cantando, conversando, bebendo. Chorinho? Não, escutamos um Samba. Mas tudo bem, não é Pagode. E olhe que até Pagode tem bom, mas parece que o nome tornou-se pejorativo, como Pop-rock. Procuramos nossos comparsas, Marcelo e Adriana. Os dois estavam com Ítalo, um amigo deles. Mesa? Não. Uma base de alvenaria encostada no muro do bar era cadeira e mesa. Cerveja? Skol, Antarctica e Brahma. Sentamos.
Logo apareceu um copo descartável na minha mão que encheu e secou na mesma velocidade. Parecia que havia um mês que não sorvia aquele líquido delicioso. Depois do gole dei uma checada rápida no local. O bar não tinha nome. Não tinha cardápio, não tinha tira-gostos variados. Não tinha mesas e cadeiras suficientes. Não tinha banheiro decente. A água que caia no esgoto da pia escorria por um cano diretamente para o ralo do chão. Quando alguém pedia um tira-gosto, queijo de coalho por exemplo, era necessário que o dono do bar gritasse: – queijo, quem pediu o queijo. Uma zona. Apesar da zona, tudo permaneceu tranquilo. Na olhada observei frequentadores de aglomerações (pedintes), playboys, patricinhas, rastafáris, putas, skatistas, orfãos dos Los Hermanos (o povo riponga com chinelão de couro e camisa indiana do setor II da UFRN), gringos, punks (!), velhos (inclusive um com cabelo grande e tererê de osso), chatos, como eu, e até Mutantes em forma de samba. É, Mutantes a banda. “Ando, meio desligado, eu nem sinto, meus pés no chão…”, a letra acompanhada por tantã, violão, cavaquinho, tamborim, surdo e até escaleta. Na roda de samba também estava CBI do Mad Dogs. Em certo momento a junção de tantos instrumentos e músicos profissionais e amadores me deu a impressão que cada um fazia um solo. E quando Chico Buarque resolveu aparecer, os estudantes de psicologia e jogadores de peteca do setor II caíram na roda. E tome um coral de jovens e velhos, brancos e pretos, pobres e ricos, sambistas e modistas.
É. O que um local como esse desperta nesse pessoal? Será que é Hype? Será que o samba é Hype? Ou será que eu estou ficando doido e não entendi nada? Antes da meia noite todo mundo foi expulso. Expulso mesmo. A cerveja acabou, a banda parou e o sono chegou. O dono ao meu lado perguntava: “Vamo lá?”. E fomos. Até agora estou tentando entender o que eu vi ali. Deve ser o samba que voltou a moda, como tudo um dia volta. A bola da vez é ele, e o folk, já ia esquecendo. Samba virou cult, chique. Em meio a tantas meninas bonitas cantoras, uma se destaca sem alarde: Teresa Cristina.
O samba é uma unanimidade assim como o futebol brasileiro, mas para ouvir nessas situações quase surreais torna-se até uma trilha de filme trash, Zé do Caixão ali gritando “Você, você e todos você” não estaria deslocado. Tenho até um disco de Cartola, mas assim como as rosas não choram, eu prefiro acreditar que aquele point deixará de ser hype em breve, quando o samba voltará a ser o que ele é, o samba. O lugar voltará ao normal e cairá no esquecimento, como todos os lugares aqui nessa cidade de merda embalada a modismo.
Saudades da Companhia de Choro Potiguar regada a cerveja.