Por Marielle Ramirez
Aconteceu entre os dias 21 e 23 de novembro a 14ª edição do Goiânia Noise, festival dos mais conhecidos no circuito independente nacional, que tem à frente um dos mais bem sucedidos empreendimentos do mercado da musica independente brasileira – a Monstro Discos – conhecida pelo catálogo que conta com mais de cem títulos, produções de eventos, e agora, conexões internacionais.
A primeira noite teve início quando o dia ainda estava claro. Eram pouco mais de seis e dez da noite, horário oficial de inicio dos shows, e a primeira banda que subia ao palco era a conterrânea Gloom, uma das finalistas do TacabocanoCD – projeto comandado pelo Fósforo Cultural, outro núcleo produtivo local de destaque.
Por ali já estavam alguns produtores e jornalistas que haviam chegado horas antes no Centro Cultural Oscar Niemeyer, atraídos pela conferência Rumos do Circuito Brasileiro de Festivais de Música, às 16h, que acabara sendo substituída por uma reunião de produtores associados à Abrafin.
A reunião – que debateu entre temas administrativos da associação o mapeamento dos festivais associados que será apresentado no próximo ano – se estendeu ate às 18h. De lá todos seguiram em direção a praça de alimentação próxima a um dos palcos que levava o nome do selo Trama, um dos parceiros do festival.
Confira mais fotos no Flickr da Abrafin
Um dos produtores presentes, Anderson Foca, do Festival Dosol, era um dos mais entusiasmados com o início da empreitada, que até o último dia somaria pouco mais de 20 horas de shows. Ele já esteve em Goiânia diversas vezes, e meio a uma novidade e outra que contara sobre as produções que realiza em Natal – sua terra de origem – destacou os resultados angariados pelo festival Dosol 2008, cujo DVD será lançado no início do ano.
Sobre o Noise – escrevera mais tarde em seu portal – é uma edição que aponta para o futuro.
Depoimento de Anderson Foca
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Foca havia chegado dias antes na cidade a convite da Brasil Central Music, onde atendeu a conferência ‘Consolidação Circuitos Regionais’, um dos temas na vasta agenda do BCM, que em, seus três dias – aconteceu entre 18 e 20 de novembro – contou com uma programação que além dos seminários, compreendia rodadas de negócios, seminários, workshops e shows.
Junto dele, foram convidados para a ocasião produtores brasileiros conhecidos, como Talles Lopes (Goma e festival Jambolada – MG), Rafael Rossato (Agência da Música), João Marcelo Bôscoli (Trama), e também profissionais atuantes no setor da música independente de outros países. Produtores de festivais já consolidados como é o caso do canadense Pop Montreal e do belga Pukkelpop (representados pelos organizadores Daniel Seligman e Jan Keymis),e também donos casas de show, como é caso da argentina Niceto Club, representada pela proprietária Diana Glusberg, além de jornalistas americanos e donos de selos europeus, permaneceram na cidade até o último dia.
Somado a eles, outro esquadrão gringo, só que desta vez de bandas, chegariam à cidade dias depois, fazendo do GN a edição mais internacional do calendário de 2008 da Abrafin. Ao todo foram dez bandas internacionais, vindos dos Estados Unidos, Bélgica, Canadá, Chile, Argentina e outros.
O intercâmbio com cenários internacionais foi, aliás, a prestação de serviço mais destacada pelos convidados. Pablo Capilé, do Espaço Cubo e produtor de festivais como o Calango e o Grito Rock, sublinhou a ousadia chancelada pelos produtores em trazer tantas bandas – mesmo sendo desconhecidas pelo grande público. “É uma iniciativa que apesar de não trazer grande público , agrega valor à cena da música independente nacional, pois intensifica o diálogo com cenários de outros países, e coloca o Brasil definitivamente na rota da música independente internacional numa escala diferenciada da que viemos trabalhando nos últimos anos”.
Capilé afirma também que a edição do Noise deste ano chancela definitivamente a Monstro como o maior selo de música independente do país, e coloca o Noise na posição de festival que “dita tendência”. “Ano passado eles já haviam feito isso quando apresentaram uma programação de palestras sensacional, e uma programação musical melhor ainda, e pautou as programações deste ano. Esse ano, mais uma vez, o Noise se posiciona como quem vai pautar as produções do próximo ano”.
Lúcio Ribeiro, jornalista de um dos mais acessados veículos especializados em músicas – o Popload – crê também que o Noise “puxará os festivais brasileiros”. Ele pondera, no entanto, que é precipitado afirmar que a produção entrou para a rota do circuito internacional, pois para ele, há um longo caminho a ser percorrido pela cena nacional para a aquisição desse status. “Acho os festivais brasileiros estão no caminho, mas que ainda é preciso crescer aqui dentro. Estamos muito novos ainda para pensar em fazer uma cadeia fora, é muito importante trazer esses caras, e continuar indo pra fazer intercâmbio lá fora, mas ainda assim é um pouco precipitado afirmar isso. A gente está no caminho de se resolver, hoje existe cena no Brasil, coisa que até alguns anos não existia. Eu imagino que em 2020 vamos estar com uma cena espetacular”, projeta.
Entrevista com Lúcio Ribeiro
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No tão comentado novo momento da música em nível internacional, no entanto, não espantaria num médio espaço de tempo alguns festivais de diferentes países começarem a travar debates institucionais, num grande fórum da música independente internacional. Seria como pensar há alguns anos no avanço de cenários até pouco tempo impensados, como os do Acre, do Amapá ou de Cuiabá, fato que possibilitou a expansão do setor, em escala nacional, fazendo surgir iniciativas importantes como a Abrafin.
MAIS NOISE – Outra aposta da 14ª edição do Goiânia Noise foi resgatar bandas do underground brasileiro que há muito não se via nos festivais independentes. “Esse ano teve bastante banda antiga brasileira voltando à ativa. O legal é que não decepcionaram: tanto a Gangrena Gagosa, quanto o Mikey Junkies fizeram shows bem legais, mostraram que ainda têm fôlego. Mas também tem outras bobagens tipo Os Ambervisions. Não achei a menor graça”, disparou José Flávio Júnior, jornalista atualmente em atividade na Oi. Para José Flávio, a programação do Festival Bananada 2008, outra produção assinada pela Monstro, foi mais interessante musicalmente.
No contraponto, Fabrício Nobre, um dos organizadores, destacou que o formato da programação adotada neste ano poderá ser aplicado nas próximas edições. Pontuou: “Colocar as bandas novas brasileiras, bandas que estão lançando CD’s da Monstro, trazer os clássicos do Underground, colocar as bandas de Goiânia que estão bem no palco principal e dar uma internacionalizada pesada na programação”.
Entrevista com Fabrício Nobre
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Nobre disse ainda que a internacionalização da programação recebeu influência das visitas que fez a alguns países durante o ano. “Tive a oportunidade de visitar os lugares, fui ao Canadá, aos EUA, à Bélgica, Dinamarca, Escandinávia, então a gente consegue perceber que tem interesse dos artistas em virem pra cá”.
Público – Mais indiferente às questões técnicas, o público de Goiânia não decepcionou e garantiu uma atração à parte para os convidados de outras localidades, seja pela indumentária, receptividade ou até mesmo, pelas tão comentadas mulheres bonitas. Durante os três dias – segundo os dados da organização – pelo menos nove mil pessoas circularam pelo Oscar Niemeyer (com destaque para a sexta-feira) fazendo valer a fama de curiosos e receptivos a novidades, mesmo quando a programação não conta com headliners conhecidos pela grande mídia. Ponto para os construtores da cena goiana que vêm investindo em conceito, em detrimento dos grandes nomes da indústria.