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BRUNO NOGUEIRA (PE): A ECONOMIA SOLIDÁRIA NA MÚSICA

Por Bruno Nogueira, Salvador (BA)

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Quando um grupo de amigos decide montar uma banda, ensaiar, gravar um EP e, quem sabe, arriscar alguns shows, quase sempre não faz idéia de quanta gente está envolvida em todo esse processo. Do vendedor de instrumentos ao dono do estúdio, passando pelo produtor da casa de show e o próprio público, todos estão em uma mesma cadeia produtiva. E todos estão sempre com um mesmo problema em comum: a falta de dinheiro.

Ao perceber que tantas pessoas estavam conectadas, um grupo de bandas independentes do Cuiabá, em Mato Grosso, decidiu montar um sistema de cooperativa inspirado em modelos de economia solidária. “Hoje em dia até para ser egoísta você tem que pensar coletivamente”, brinca Pablo Capilé, a frente do Espaço Cubo. Formado em 2002, a idéia inicial deles era viabilizar um circuito onde os grupos podiam se apresentar ao longo do ano inteiro.

“Eu troquei um carro em um estúdio e passamos a convidar algumas bandas para ensaiar lá”, lembra Capilé de como foi o começo de tudo. Nesses encontros, ele começou a conversar sobre política pública com as bandas locais. “O que era uma secretaria municipal, o que é um conselho”, conta. De lá, eles montaram mais duas frentes. A Cubo Eventos, para organizar shows, e a Cubo Comunicação, para dialogar com a mídia.

Para viabilizar isso, eles criaram uma moeda própria, o Cubo Card. “As bandas se apresentam e recebem um número X de card para utilizar uma série de serviços”, explica Pablo Capilé. “Elas usam para ensaiar; alugar nossa casa de shows, fazer eventos e ficar com a bilheteria; pagam a segurança com card, alugam o som”, lista. Hoje, eles articularam ainda mais usos para a moeda. “Já tem plano de saúde com card, curso de inglês, alimentação em restaurante, compra de roupa e locação de dvd com card”.

Essa estrutura deu base para lançar duas das principais bandas do circuito independente hoje no país. Vanguart e Macaco Bong são presenças confirmadas na programação de qualquer festival, enquanto a primeira já começa a alçar vôos maiores ao assinar com a gigante Universal. “Aqui em Cuiabá, quando as bandas começam já passam a formar coletivos”, diz Pablo Capilé. “Cada integrante vai fazer parte de uma comissão, seja de eventos, sonorização e comunicação, para a banda aprender a se auto-gerir”.

A espinha dorsal dessa articulação é o Festival Calango, um dos principais do circuito independente do país. “Quando os eventos vão agregando um valor maior, você consegue trazer o investimento da iniciativa privada. Não em dinheiro, mas em produtos”, explica o produtor. “No festival, gastamos quase R$ 15 mil em alimentação no restaurante e, em contra partida, ele passa a fazer parte de nosso sistema financeiro”.

Pablo Capilé, que estará em Salvador, na próxima quinta-feira (13), durante o Fórum de Música, Mercado e Tecnologia, para falar sobre cooperativismo na música, encerra explicando que “essas iniciativas fez surgirem mais bandas e, consequentemente, fez esse mercado girar. Com o tempo, as próprias empresas passaram a investir mais em produto e em espécie na cena de Cuiabá”, uma lógica de mercado que ele acredita ser ainda mais viável no Nordeste.

* Publicado originalmente no Caderno Dez! no jornal A Tarde

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