O terceiro e último dia do Festival DoSol provou que o público de Natal gosta mesmo é de hardcore. Um público estimado em três mil pessoas compareceu à Rua do Chile, em um bonito desfile de camisetas pretas ostentadas por uma molecada sedenta por barulho.
Como no dia anterior, três bandas locais tocaram no final da tarde no DoSol Rock Bar. Destaque absoluto para o Ravanes, que incendiou o local com seu poderoso thrash metal. Abriram com “Intro”, do Sepultura, e fecharam o show com “Roots, Bloody Roots”. Entre as duas músicas, o Ravanes mostrou uma porradaria só, responsável por moshs, rodas e uma saudável insanidade por parte do público. Ano que vem com certeza estarão no palco da Rua do Chile. Já a Fliperama e o Pots se mostraram ainda bem verdes. A primeira ainda pareceu ter algum futuro com sua visível adoração pelos Ramones. Já a segunda mostrou um hardcore / hiphop que carece ainda de muita, mas muita maturação para dizer algo de relevante.
Os paraibanos Dead Nomads levaram seu hardcore tipicamente californiano para o palco da Rua do Chile. Até aí, mais do que compreensível. Duro de engolir mesmo foi a versão que fizeram para “Bigmouth Strikes Again”. Mesmo assim foi um bom show.
Já a apresentação do local Karpus foi constrangedora. Começaram o show pedindo paz no mundo e carregando uma bandeira do Líbano. Até aí, tudo bem. O problema teve início quando começaram a tocar seu hardcore melódico insosso, ingênuo (no pior sentido) e muito mal feito. Mas, é bom deixar registrado, a molecada adorou.
Quem também teve problemas foi o Astronautas. Com nova formação, desfalcados de uma guitarra, o som do grupo ficou um pouco vazio e perdeu muito de sua pegada. A qualidade do som também não ajudou. Ainda assim a banda teve uma bela recepção do público potiguar. Mas ficou claro que o formato em trio não foi feito para eles.
Curioso mesmo foi o show do Allface. Justo na estréia de Ana Morena envergando o baixo da banda, eis que o dito cujo resolve falhar e ficar mudo logo no início do show. Depois a uruca foi geral e deu pane em todo o palco. Por incrível que pareça, nada poderia ter sido melhor para eles. Assim que ajeitaram o palco a banda começou a tocar com uma raiva, raça e agressividade que fizeram com que sua apresentação ficasse extremamente interessante, mesmo para quem, assim como eu, não é lá muito fã do estilo deles.
O paulistano Aditive é nome de forte apelo em Natal. Mas faz um sonzinho bobo e chocho. Como Natal parece ser uma cidade muito afeita à hardcore melódico e ao emo, foram extremamente bem recebidos.
Fenômeno mesmo é o Jane Fonda. Banda mais popular de Natal, o grupo parece aumentar cada vez mais o seu fã clube. Lembro que no ano passado achei a banda mais madura e pesada. Este ano a impressão foi inversa: achei seu new metal imaturo, apesar de bem tocado e trabalhado. Enfim, foi um dos shows mais concorridos da noite. Mas continuo achando o Jane Fonda um mistério a ser solucionado.
O Devotos entrou no palco e com eles a roda-de-pogo se fez presente durante todo o show. Cannibal ainda reclamou do público, que, segundo brincadeira dele, era “um bando de frouxo que estava com medo de entrar na roda”. Priorizaram acertadamente o repertório do “Agora tá Valendo”, álbum de estréia da banda, e tocaram a nova “Rádio Comunitária pra Informar”, presente no mais recente álbum deles, “Flores Com Espinhos para o Rei”. O final com “Punk rock hardcore Alto José do Pinho” foi apoteótico, fechando aquele que foi o melhor show da segunda edição do DoSol.
Dead Fish, parte um: a banda está cada dia mais parecida com o CPM 22, comparação longe de ser elogiosa. Está aprendendo a jogar com as regras da indústria debaixo do braço. Ou seja, estão dispostos a abrir mão do peso para conquistar mais público e dinheiro. O esquema MTV, sabe? Enfim, os mais xiitas podem chamá-los de vendidos sem o menor constrangimento.
Dead Fish, parte dois: o vocalista Rodrigo é um sujeito inteligente, dono de boas letras e carismático até a alma. A banda fez um show tecnicamente perfeito, sem nenhum problema, levando o público de Natal ao delírio. Enfim, marcas de uma banda que permanece em cima do muro, mas que cai cada vez mais para o lado da opacidade musical imprimida pela indústria da música jovem no Brasil.
Considerações finais: quero deixar registrado que viajamos à convite da produção do festival e tornar público nosso agradecimento ao Anderson Foca e à toda a produção do evento. Ressaltar que ele (o festival) permanece muito bem organizado, apesar das falhas no som dos shows de algumas bandas, coisa normal para um evento que comporta mais de 40 bandas em sua programação. Talvez um enxugamento no número de bandas no próximo ano fosse interessante. No mais, minha única queixa é que os três dias do Festival doSol passaram rápido demais…