Notícias

OPINIÃO: RODRIGO LEVINO FALA DAS NOVAS CANTORAS

A MPB passa por renovação de vozes – majoritariamente femininas – quase sempre num período entre dez e quinze anos. Para ficarmos num referencial não muito distante, a década de 1990 trouxe nomes como Marisa Monte, Adriana Calcanhotto, Daniela Mercury e guardadas as devidas particularidades da música que fazia, Cássia Eller. Ou ainda as talentosas mas sem tanto apelo junto ao grande público, como Renata Arruda e Rita Ribeiro.

Na última década a safra foi renovada com Maria Rita, herdeira (não exatamente do talento) de Elis Regina (que vá lá, disputa na cabeça de alguns com Maria Bethânia o título de maior cantora da MPB), Ana Carolina e Vanessa da Mata. Mais recentemente a coisa parece ter tomado uma dimensão maior, pelo menos em número absolutos de novos talentos vindo à tona, do que o ocorrido na década anterior, com o aparecimento de Teresa Cristina, Roberta Sá, Mariana Aydar, Marina De La Riva, Céu, Tita Lima e Ana Cañas.

As redifinições pelas quais o mercado fonográfico passa atualmente atingiram em cheio a perspectiva e a noção de sucesso dos novos nomes que foram surgindo nos últimos cinco anos. A improbabilidade de vender milhões de discos (a lembrança mais próxima disso é da estréia de Maria Rita) fez com que as novas cantoras readequassem suas carreiras e um público médio, de pouco apelo popular, mais afeito à crítica especializada e longe da tríade que sustentou durante anos a carreira de muita gente da MPB: rádio-disco-novela.

Nisso, e sabe-se lá por quais motivos, preencheu-se uma lacuna de louvação ao samba que tinha ficado de lado na vertente pop – pelo menos como referência-gema – que norteou a carreira das principais cantoras da década passada. O samba, na década do seu centenário, está na moda e com roupa nova. Mas deve ser tão guia assim? É uma possibilidade esgotada em si? Certamente não. A novíssima MPB carrega o estereótipo das meninas talentosas, bem nascidas e que apostam todas as fichas numa releitura do ritmo tipicamente brasileiro acrescido de ruídos eletrônicos e variações malemolentes da batida clássica ou pendor jazzístico na interpretação de clássicos mofados.

A palavra louvação cai como uma luva na postura das novas cantoras. A escolha de um repertório com pequenas variações e repaginações do que é comumente chamado de clássico na MPB transparece a intenção de ser chancelada pelos grandes nomes, numa reverência desmedida que acaba queimando as pontes do diálogo com a maior parte do público da mesma geração, ao invés de despertar o interesse pelas referências.

Um exemplo de como a reverência é descartável é o disco Cê, último lançamento de estúdio de Caetano Veloso. Um disco com uma veia pop e um frescor tão despojado que causa constrangimento à performance excessivamente contida e conservadora da maioria das novas “divas da MPB”. Ou seja: elas não fazem jus à geração a que pertencem e cultuam (mesmo que sinceramente) em demasia o que pode ser renovado com mais vigor e não apenas ruidinhos eletrônicos. Caetano tem feito mais que elas aos vinte e poucos, depois que atravessou o cabo dos sessenta anos.

A temática do novos discos vagueia entre a negação da condição de bem nascida com a admiração por coisas ditas da cultura de raiz, fechando, como se não bastassem as limitações naturais do atual mercado, o foco num público urbano de classe média e interesse de curiosidade muito mais que envolvimento profundo com a cultura de raiz brasileira. Nisso inclue-se o samba. O alcance pop com qualidade, coisa que Marisa Monte conseguiu atingir na sua carreira a ponto de fidelizar um público capaz de consumir qualquer que seja o seu experimentalismo sonoro, foi deixado de lado, em parte pela limitação da nova realidade comercial, mas muito culpa de uma postura subserviente em relação aos grandes nomes. Coisa que Marisa, por exemplo, soube dosar na sua admiração pela velha guarda da Portela, mas sem esquecer da liberdade dos Tribalistas.

Onde está o cotidiano de um jovem com vinte e poucos anos com um referencial de cultura pop muito mais arraigado (coisa que acontece na maioria das vezes) do que o de cultura de raiz? Nas músicas de Amy Winehouse, Kate Nash, Adele, Britney Spears, Rihanna e Emmy The Great. Não há um nome sequer da nova música brasileira que tenha escolhido se apropriar dos fatos corriqueiros da vida de um jovem forjado na era da internet, do cinema de Quentin Tarantino e vá lá, dos exageros e voluntarismos típicos dessa idade, vide o drama da rehab de Winehouse. Será uma versão “hippie de boutique” da música brasileira?

Com exceção da baiana Pitty, a prova irrefutável que há mercado e um vasto público a ser conquistado com um pouco mais de rebeldia, nenhum outro nome se aproximou (mesmo que resguardado a uma parcela mais jovem de quem consome música) dos dilemas da juventude, da negação da ordem vigente e dos valores tradicionais exacerbados nesse entremeio de adolescência/juventude. Preferiu-se subir (quando muito) ao morro ou admirá-lo de longe com suas rodas de samba e tentar reproduzí-las no asfalto com pitadas tímidas de modernidade.

Com isso, até o referencial e a subserviência são falhos, pois esquecem de como os grandes nomes da MPB se utilizaram de alicerces muito mais amplos, mesmo quando vestidos com a couraça do regionalismo, vide o tropicalismo, e até mesmo a bossa nova com sua ascendência mezzo carioca mezzo jazz americano.

Quem representa melhor, portanto, a nova – de fato – música brasileira se não Ivete Sangalo? Nas entrelinhas do apelo popularesco vê-se uma evolução da música produzida pela baiana que, aversa à rebeldia, consegue ao menos emular uma diversidade maior de influências sonoras num caldeirão que junta a reverência à música tradicional de onde nasceu acrescida de funk, rock, swing e balada.

Fala certamente mais alto aos corações (pena que muito mais aos ouvidos prestes a ter os tímpanos estourados pelos trios elétricos) do que as meninas com talento de sobra mas o pé fincado demais no passado. Os tempos são outros. Tempos estranhos para alguns, mas que pede uma música que sirva ao menos para dizer não à clinica de reabilitação, que não queira levantar tanta poeira, mas que também não rodeie uma saia caríssima da Les Lis Blanc numa roda de samba em plena favela. Pode soar como dissimulação. Quem se habilita?

Previous ArticleNext Article

19 Comments

  1. e a cantora Kimberly Kuhn??e ela ainda nao chegou ao Brasil,mas quando chegar………….gente fiquem ligados(brasileirissima,toda nossa).beijos

  2. Concordo com o Nazarito

    Esta menina, SÁLOA FARAH, vai dar o que falar.
    Voz, afinação e show, pura MPB tradicional.

    Grande abraço em todos,

  3. Não consigo parar de ouvir a interpretação de Tulipa Ruiz e Karina Buhr, seriam os nomes escolhidos por mim para ampliar a lista. Fora Catarina Dee Jah, que mesmo nova, mergulha bastante no trabalho que faz e nas suas origens, ao contrário dos novos “vasos de infeite” que vêm ganham espaço em discussões.

    Ouvi as sugestões e escutei a Sáloa, não sei se foi a mesma, mas a música que começava com “Sento na cadeira do escritório” não despertou muita coisa em mim, mesmo sendo cantada por uma voz bastante afinada…

  4. Olá estamos curiosos com essa nova cantora Kimbely kuhn, estamos precisando de novas cantoras talentos brasileiras e claro. Quanto ela chega bjs

  5. Boas sugestões, eu sou de Cabo Frio e aqui tem algumas boas cantoras,
    mas sugestão por sugestão..Sugiro Cicy Arcangelo como boa mpb.
    Ela é realmente alguma coisa nova que nunca vi..linda voz e canções.

  6. Ouçam Adryana BB que tem um super talento, cd na praça( Do barro ao ouro) é Pernambucaníssima com um pé no Rio de Janeiro, onde faz parte de um projeto chamado Rio Maracatú, seu trabalho é MPB da mais alta qualidade, com a sensibilidade de alguém que sabe do que está faz.

  7. Ouçam Adryana BB que tem um super talento, cd na praça( Do barro ao ouro) é Pernambucaníssima com um pé no Rio de Janeiro, onde faz parte de um projeto chamado Rio Maracatú, seu trabalho é MPB da mais alta qualidade, com a sensibilidade de alguém que sabe o que faz e nos oferta sua alma e sensibilidade na voz e nas canções.

  8. Texto extremamente coerente o seu, Paulo. Talvez a pessoas que criticam o sucesso da Maria Gadú não se atenham ao fato de que ela sim é uma cantora que fala aos tempos atuais. O passado está fora de moda, e ninguém entendeu ainda. O desejo de identificação com as canções sempre existirá, e as novas cantoras não andam se ligando nisso, e em busca de um preciosismo, de uma louvaçao desnecessária, acabam ficando sem tocar as pessoas como as mesmas desejam ser tocadas.
    Eu costumo dizer que as novas cantoras tem alma atrofiada, pq o q alimenta a alma do artista é a voz do povo. E elas tb tem as vozes muito parecidas, salvo algumas boas exceções.
    É preciso saber q afinaçao é importante, mas n é nem de longe o principal ingrediente de uma cantora.

  9. Meu querido Rodrigo, parabéns pelo texto e pela crítica, maravilhosa, ouvi todas essas novas cantoras e o que senti? Sono, tédio esperava algo novo, algo mais, realmente uma não é diferente da outra, parecidinhas como soldadinhos de chumbo. Maria Gadú foi a que menos me deu sono, talvez pela voz diferenciada.

    Muito bem dito, as divas da MPB não são essas novas que se dizem por aí, mas sim as eternas que bem conhecemos. Se aparecer uma nova que nos faça tremer, por favor indique ae.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *