Por Maíra Hinose – Publicado originalmente no portal Dynamite
Marcada pela pluralidade e pelo desapego às definições pré-estabelecidas dentro das classificações musicais, os pernambucanos do Nuda conseguem elaborar canções singulares e, ao mesmo tempo, atingíveis a um público amplo e bastante variado. Tal abnegação aos moldes é tão nítida em suas produções – visto que o grupo se embrenha na vastidão do mundo da música, na busca incessante de se agregar diversos gêneros, explorados por cada um dos seus integrantes das mais variadas formas – que a banda cria um som indefinível, embora seja possível detectar influências de rock, música experimental, jazz, blues e até mesmo música regional brasileira.
A fórmula deu tão certo que com dois anos de estrada a banda vem abocanhando cada vez mais espaço dentro do cenário musical no qual está inserido (entenda-se Pernambuco e região). Integrado por Henrique (no baixo), Arthur Dossa (na guitarra e violão), Rapha (no vocal e guitarra) e Scalia (na bateria e percussão), o Nuda é mais um prova de que é possível, sim, fazer um som “eclético”, abrangente, sem estereótipos em termos classificatórios, que soe bem a todos (ou quase) os ouvidos. Basta estar aberto e disposto a se inebriar em suas canções, que, aliás, têm uma presença muito forte de poesia, na dosagem certa, gerando assim, algo puro e sutil.
Dotados de grande talento, criatividade, consciência e conhecimento do que se faz, os pernambucanos do Nuda provam que a receita para se conquistar seu espaço dentro de um mercado tão concorrido e ingrato é pura e simples: agregar todos estes componentes em um único produto à garra e vontade de fazer as coisas acontecerem, que é o caso do grupo. Tanto que em apenas dois meses de lançamento do primeiro EP “Menos Cor, Mais Quem”, que compila cinco canções (“Alumia”, “Colibrilho”, “Deus, às Éticas”, “Duns” e “Fato: Mamado Vado”), a banda lidera o ranking de acesso do myspace, conquistando o Top 10 da categoria bossa-nova, entre outros sites de música, como o Trama Virtual, também, onde obteve destaque na página principal, por ter alcançado o quinto lugar nacional e primeiro em seu estado (PE).
O que rendeu ao grupo convites para os principais festivais de música independente do Brasil, como o Festival Novas do Sol Rock Bar, realizado no mês de janeiro, em Natal (RN). E como fizeram jus à confiança e credibilidade depositada neles, com participação elogiada pelo público, os integrantes do Nuda conseguiram transformar um caldo de galinha em uma canja, garantindo assim, participação no Festival do Sol Warm Up, que acontece agora em março (29/03), em Natal, também.
Com canções encantadoras e embora retratem aspectos simples do cotidiano, elas conseguem, ao mesmo tempo, nos atingir de maneira profunda. Talvez seja pela poética utilizada nas suas composições, seja na forma de se abordagem dos temas e estrutura das palavras, facilmente perceptível no título de cada uma delas, cujas construções beiram à poesia pura. O Nuda tem tudo para trilhar um caminho de sucesso. Basta continuar atuando da mesma forma, sem pôr ou tirar uma vírgula, que, com certeza, um dia, os músicos chegam lá, do Nordeste para o Brasil e quem sabe até para o mundo. Sonho inatingível? Não, só depende da banda.
Por enquanto, a banda não tem nada certo e a previsão é migrar para cá com seu som. Portanto, o que nos resta é aguardar que os olhares do Sudeste se voltem ao talento da banda e façam o mesmo, né não!? E enquanto isso, teremos que nos contentar em ouvir suas canções pelo myspace (www.myspace.com/sitionuda) ou o site da Trama Virtual (www.tramavirtual.com/nuda).
Agora, se quiser matar a curiosidade sobre a banda, confere a entrevista que fiz com Henrique, baixista do quarteto, onde ele conta um pouco da história do grupo, as impressões dele diante do cenário underground e seu crescimento em todo o País, nos últimos anos, os planos futuros e muito mais.
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Maíra Hirose/ Dynamite – Como nasceu o Nuda?
Henrique/ Nuda – Foi um processo longo e espero que duradouro. Eu tinha tocado com
o Dossa, que conhecia o Rapha e que estudou com o Scalia, numa daquelas
coincidências. Scalia e Rapha sempre compuseram, criamos uma amizade
muito forte e começamos a nos reunir só pra fazer jams sessions, isso durou
meses. Aí resolvemos trazer as jams para dentro das letras, as músicas pra
dentro das jams e aqui estamos.
M.H./ Dynamite – O Nuda tem como prioridade fazer um trabalho desvinculado de qualquer estereótipo, tanto que são notórias as mais diversas influências musicais nas canções do grupo. Quais são as influências maiores e que sempre estarão presentes na obra da banda?
Henrique/ Nuda – Não tem como negar que somos fascinados pela música brasileira. Todos na banda começaram no rock, e isso é muito forte até hoje no nosso
som, mas fomos conquistados pela vastidão dos ritmos daqui, tão
ricos e cheios de personalidade. Na verdade, somos meio garimpeiros, e
aí acontece muito de um descobrir, por exemplo, um artista da Zona da
Mata pernambucana, enquanto outro traz para a galera conhecer uma banda “gringa”.
M.H./ Dynamite – Como surgiu o nome “Nuda” para batizar a banda?
Henrique/ Nuda – O Rapha teve a idéia no meio de um brainstorm e todos gostaram da
sonoridade. Fomos encontrando significados que condiziam com a nossa proposta, no qual é justamente não estar vestido de formatos, principalmente, por acreditarmos que isso seria limitativo. Sem contar que a gente já sabia que esse nome ia trazer imediatamente esse pensamento meio doido da banda nua em cima do palco. Mas isso a gente deixa para o Red Hot Chilli Peppers.
M.H./ Dynamite – Com pouco tempo de carreira, vocês já conseguiram participar de grandes festivais de música. A que vocês atribuem tal conquista, visto que mesmo dentro do circuito underground existe uma barreira intransponível até se conseguir adentrar nele?
Henrique/ Nuda – Hoje existem tantos meios de divulgação que nem tomamos conhecimento desta barreira. Desde o começo da banda nos preocupamos em ter um material legal de divulgação, gravar em bons estúdios e disponibilizarmos as músicas de forma atrativa. E isso não é necessariamente um sinônimo de altos gastos. Também estamos sempre de olho na cena independente do País inteiro, fomentando contato com organizadores, mostrando material, etc.
M.H./ Dynamite – Como foi a experiência de participar destes festivais? Qual a contribuição para a carreira de vocês?
Henrique/ Nuda – Pelo menos até agora, tudo tem sido bastante positivo. É motivante
presenciar a relação da galera para fazer estes festivais acontecerem, para estabelecer esse novo mercado da música. Na verdade, estamos começando a tocar nos festivais maiores. Ainda estamos no terceiro mês de lançamento virtual do EP, mas um dos aspectos mais legais é ver um pessoal, como lá em Fortaleza (CE), no Grito Rock, onde tocamos na periferia, a cooperativa local se organizou fazendo tudo com muita raça e amor. Foi incrível!
M.H./ Dynamite – Desde o começo do Nuda, vocês têm investido bastante na internet como ferramenta de divulgação do trabalho do grupo, certo!? Qual o papel que a internet tem para os músicos e/ou bandas, atualmente, principalmente, para vocês que residem fora do eixo Rio/SP, em Recife?
Henrique/ Nuda – Acho que a internet vem descentralizando muita coisa, e essa
democratização só traz lucros para os artistas. O mercado alternativo, que a cada dia está ficando menos alternativo, cresceu como nunca, nos últimos anos, principalmente por ter uma mídia tão forte e barata quanto à internet. É uma revolução até para a questão do que é o “ser” artista, já que atualmente ele exerce, também, outros papéis na produção do seu trabalho.
M.H./ Dynamite – É fato que a cena alternativa hoje vem adquirindo cada vez mais espaço na produção artística de forma geral, tendo-se em vista a quantidade crescente de festivais e produtoras e gravadoras nos dias de hoje. Como vocês avaliam isso, dentro do meio que em atuam, o musical?
Henrique/ Nuda – A tecnologia trouxe a facilidade e a internet deu a liberdade de expressão. Hoje, cada vez menos artistas seguem fórmulas, a espontaneidade voltou com tudo e os parâmetros de sucesso mudaram completamente. As bandas gastam menos para produzir um bom álbum e pouquíssimo para divulgar. Os festivais estão em crescimento, dando cada vez melhores condições aos artistas e aos selos, que não precisam mais de tanto investimento para ter um artista em seu casting. O problema está no fato de ainda faltarem mais soluções para que esta cena seja auto-sustentável, mas acredito que isso só o tempo responderá, afinal nem as maiores estão sabendo lidar com a situação atual.
M.H./ Dynamite – Integrar o cenário underground é uma opção ou objetivo para o Nuda? Quais as vantagens e desvantagens disso?
Henrique/ Nuda – Acho que fica complicado responder isso. Integrar este ou aquele
cenário não é objetivo, nem opção nossa. É apenas a conseqüência de uma manifestação artística e com certeza, iremos continuar sempre fazendo aquilo que for verdadeiro para nós.
M.H./ Dynamite – Na concepção de vocês, quais os músicos e/ou bandas que integram a cena alternativa hoje e merecem destaque?
Henrique/ Nuda – Se for para falar dos que merecem, eu não paro de escrever a lista nem amanhã (risos). Mas posso te falar de duas bandas bem legais daqui de Recife e que já dividimos palco: Tabacos de Guevara e Amps & Lina. Tem uma banda de Minas, chamada Nós, que achei fantástica!
M.H./ Dynamite – Como vem sendo a aceitação do público diante do EP que vocês lançaram recentemente?
Henrique/ Nuda – Lançamos o “Menos Cor, Mais Quem” no myspace no começo do ano (01/01), ou seja, há pouquíssimo tempo. E resposta do público está sendo fantástica, estamos sempre entre os myspaces mais visitados, as pessoas têm comentado e temos recebido diversos convites para tocar. Isso tem sido bastante gratificante e estamos muito felizes.
M.H./ Dynamite – As canções do Nuda retratam que universo? Onde o grupo se inspira para compor suas músicas?
Henrique/ Nuda – Retratamos qualquer tipo de universo passível de materialização,
seja universalizando as particularidades de uma relação, seja personalizando a infinitude do espaço-tempo. E não é papo mole não. Estamos finalizando duas canções cujos temas centrais são exatamente esses dois citados! Tal diversidade provê a resposta acerca da inspiração. Não vemos a criação sob a ótica de “inspirações”, mas como
um continuum de circunstâncias que vêm e que vão, alimentando o nosso
inconsciente. Ou seja, qualquer fato ou objeto pode gerar a famosa “reação em cadeia” que incendeia a gênese de uma canção. E ainda bem que há um mundo de circunstâncias a serem retratadas! É preciso estar, sim, sempre aberto e atento a ele.
M.H./ Dynamite – Qual o motivo da escolha pelo português como a língua que propaga o trabalho do Nuda?
Henrique/ Nuda – O português é um dos idiomas mais ricos em termos de vocábulos,
derivações, etc. Isso se reflete, por exemplo, na beleza das nuances
possíveis e já exploradas pelos grandes poetas e compositores brasileiros. Assim, sentimos como se fosse nossa contribuição, nossa nota na sinfonia do mundo. Contudo, cada idioma oferece suas vantagens, por exemplo, a compacidade do inglês, perfeita para o rap, o famoso charme da fonética francesa etc, tanto que podemos nos aventurar idiomas afora, seja inglês, dialeto siciliano, esperanto. Manifestar é preciso, limitar não é preciso (risos).
M.H./ Dynamite – O que os membros do Nuda ouvem? Como o gosto pessoal de cada integrante da banda influencia no trabalho do grupo?
Henrique/ Nuda – Depende. Existem aqueles sons que iremos sempre escutar e que fazem parte da história da banda, como Beatles, Led Zeppelin, Gilberto Gil
etc… Porém gostamos muito da pesquisa e do que conhecemos do acaso,
apresentar novos sons à banda faz parte do nosso dia-dia. Nesse
processo, ouvimos ao mesmo tempo o Cavalo Marinho do Seu Luiz Paixão e
o rock do The Klaxons.
M.H./ Dynamite – Quais os planos do Nuda?
Henrique/ Nuda – A Nuda é formada por um grupo de pessoas que se gosta e o mais
importante é que continuemos unidos e sendo felizes fazendo nosso
trabalho. Temos muitas idéias a colocar em prática e os sons, letras,
psicodelias, grafismos, formas de divulgação, CDs, shows etc… Tudo isso é conseqüência do amor que temos diante dessa manifestação.
O grupo ouve de tudo um pouco, desde músicas regionais, como |