Primeiro dia incomum, esse do festival Recbeat. O palco mais diversificado do Carnaval de Pernambuco virou o único palco, pelo menos na abertura da programação. Uma chuva, do tipo que Recife não via já tem muito tempo, fechou todas apresentações que aconteciam no bairro do Recife Antigo. O palco principal, no Marco Zero, chegou a se deslocar sozinho por mais de um metro. Isso acabou ajudando uma maior concentração de pessoas, coisa que não costuma acontecer no primeiro dia de Recbeat. Isso + chuva + Eugene Hurtz insano no palco fez parecer que já era o encerramento. Ecos da noite histórica com Pato Fu em 2008 passavam na memória de todos.
No geral, foi uma noite mais descompromissada. Talvez com exceção da potiguar Camarones Orquestra Guitarrística, que tinha o show mais ensaiado, as outras atrações que passaram no palco estavam em clima de descontração. A começar por Catarina Dee Jah. Esse foi o segundo show que vejo dela e, pelo menos nessa noite do Recbeat, parecia que a presença dela no palco tinha melhorado quase que exagaradamente (o que se justifica, afinal, o show anterior que eu tinha visto foi o primeiro que ela fazia na carreira). Acho que pouca coisa não funciona no Carnaval do Recife e, por isso, o brega modernoso dela até agradou. Mas com o começo pontual do festival, às 20h, pouca gente arriscava ganhar banho de chuva.
O bom de uma programação enxuta (sem trocadilhos. São quatro por noite) é que permitem apresentações mais longas. Com quase uma hora de show, a chuva já tinha ido embora e mais gente se acumulava para ver o começo da Camarones. Outra que também parece ter crescido um monte desde a última vez que pisou no Recife (e olha que não faz tanto tempo assim). Cresceu principalmente a parede sonora deles, algo importante para uma banda instrumental. O impacto das músicas são bem mais fortes, ao mesmo tempo em que elas estão mais pesadas e encorpadas. Foi o show mais redondinho da noite e o único que parece ter sido ensaiado. O que não tirou a espontâneidade deles, que conseguiram fazer um show acima da média sem todos os equipamentos no palco.
O que aconteceu é que a urucubaca da primeira noite do Carnaval também atingiu o Recbeat. O festival por pouco não segue os palcos vizinhos no cancelamento. O chileno Original Hamster também tocou sem parte dos equipamentos de palco, o que deixou o som um pouco mais baixo que o normal, algo que prejudica uma apresentação de um DJ solo. Ainda assim, foi ele quem começou a dar a forma dessa edição 2009 do festival. O começo foi bem modesto e ele até tocou remixes famosos (mas de outros DJs), até pegar o microfone e começar a cantar e instigar o público, que nessa hora já estava no clima certo para a noite.
Se eu tivesse que escolher um show para a noite, seria o do DJ Dolores. Geralmente as apresentações que ele faz com banda costumam ser mais melódicas, mas para o Carnaval ele preparou um formato totalmente a favor do harmônico. Com Jr. Black (Negroove) no microfone, cantando quase como se estivesse sendo remixado ao vivo, ele deu uma nova cara a antigos hits e fez a apresentação mais animada (e honesta) de toda noite. A única coisa deslocada foi uma “boxeadora” que ficava rodando pelo palco sem fazer muita coisa. Era pelo mis-en-cene, eu sei, mas ficou informação demais.
Por um momento, parecia que o show do Gogol Bordello (que resolveu tocar com banda e não sozinho) chegou a ser mesmo uma alternativa muito melhor que o Afrika Bambaata, que tocaria originalmente na programação. Eugene Hurtz é um tipo de Kramer dançarino e perde totalmente os bons costumes quando está no palco. É bem louco, correndo, pulando e gritando como se sobreviver dependesse da adrenalina de todos. E a turma até que foi na onda dele também, fazendo o mesmo.
Mas o show teve uma pitada forte de enrolação. Por que, na verdade, ele estava apenas trocando uns CDs para tocar, cantando por cima de uns e dançando em outros. Perdeu totalmente o sentido quando ele começou a tocar O Pobre dos Dente de Ouro, do Cidadão Instigado e, depois, Alceu Valença (sério). A partir dai ficou parecendo apenas um daqueles DJs bebados estraga festa. Mas isso foi para quem tava sóbrio, vendo o show quase sentado. Para o público, tudo era festa.