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ENTREVISTA: KRISIUN (RS)

EM FASE EXPLÊNDIDA, KRISIUN CONSEGUE INOVER SEM DEIXAR DE LADO A FIDELIDADE À MÚSICA EXTREMA

Lançamento do novo álbum, “Southern Storm”, consolida jeito próprio de fazer o som mais pesado e brutal de todos os tempos. Fotos: Axel Jusseit / Divulgação.

Por Marcos Bragatto

Conteúdo: Rockemgeral

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Trio parada dura: Max, Alex e Moyses continuam fazendo o mais brutal heavy metal

Poucos imaginavam, há 18 anos, quando três irmãos cabeludos começaram a tocar o mais pesado do metal extremo no interior do Rio Grande do Sul, que o Krisiun chegaria ao estágio que chegou. Consagrado no nicho metálico no exterior (entenda-se Europa e Estados Unidos), o trio formado desde então por Alex Camargo (baixo e vocal), Moyses Kolesne (guitarra) e Max Kolesne (bateria) tem se superado, conseguindo crescer musicalmente ao buscar novos caminhos dentro de um subgênero do metal que parecia fadado à repetição. Não para o trio parada dura.

A virada na história da banda aconteceu nos dois últimos álbuns, “Works Of Carnage” (2003) e “Assassination” (2006), quando, sem abrir mão de toda a brutalidade característica, o Krisiun passou a investir em composições mais cadenciadas, com a inclusão de temas de origem no jazz/blues e grooves até então não utilizados nesse tipo de som. Tudo com uma sutileza – se a selvageria da música permite o termo – que não fez o grupo recuar um só milímetro no quesito extremo, ponto de honra não só para a banda, mas para qualquer fã do grupo espalhado por esse mundão do heavy metal.

Agora, com o novo álbum, “Southern Storm”, o Krisiun volta o provocar com uma música ultra pesada, em 13 faixas que consolidam um jeito de fazer metal extremo bem próprio. Muito por conta de, como diz o batera Max Kolesne, “sermos daqui da América do Sul”, o que inclusive inspirou o título do disco. Nessa entrevista, Max ainda falou sobre as enormes turnês do Krisiun pelo mundo, a forma de ser diferente sem largar mão de fazer som extremo, o futuro de uma banda essencialmente “física”, e outros detalhes da fase atual. Dá uma olhada aí:

Rock em Geral: Esse disco parece mais variado e, ao mesmo tempo, mais nervoso que os dois últimos. Houve a intenção de fazer algum coisa mais porrada? Qual foi o ponto de partida?

Max Kolesne: É uma série de fatores que influi. Em primeiro lugar é a evolução natural da banda, estamos há tanto tempo tocando juntos e a cada disco tentamos nos superar, melhorar as composições, dar uma evoluída. E também tem a vontade de não ficar se repetindo o tempo todo, sempre fazendo a mesma fórmula como era antigamente, aquela coisa de um som mais rápido mesmo. Nós já vimos assim desde o “Assassination”, já havíamos começado a trabalhar mais as músicas, variar os tempos, colocar mais groove, mais peso, diminuir a velocidade em algumas partes. Mas ao mesmo tempo em que esse disco tem umas variações, ele consegue ser mais brutal e mais rápido ainda. Porque as partes que são rápidas são bem rápidas mesmo, bem porrada. Foi uma evolução natural.

REG: É um consenso que nos discos anteriores vocês andaram testando músicas com menos velocidade, e esse parece mais pesado. Foi uma espécie de contraponto?

Max: Não é bem assim que funciona. Quando começamos a compor o disco, nos reunimos no estúdio e começamos simplesmente a tocar. Começamos a tocar os riffs, encaixando bateria e vocal, é uma coisa muito natural. A composição tem que fluir de uma forma natural, não é uma coisa que estabelecemos para ser assim ou assado. Começamos a partir de um riff ou e um groove, ou até mesmo de um ritmo de bateria e vamos juntando as peças e a coisa vai fluindo naturalmente. Cada disco é o reflexo do momento que estamos passando, vivendo e sentindo.

REG: Existe uma pressão, de vocês próprios, para ser cada vez mais veloz, agressivo, extremo?

Max: Isso não rola porque essa é a forma natural do Krisiun tocar, é muito natural para nós quando começa a música com os três tocando juntos, tem essa química. O som sai brutal naturalmente. Não temos essa preocupação de sermos mais rápidos, isso não existe, não damos mínima para esse tipo de coisa. A nossa preocupação é a de músico profissional, de estar sempre em forma para tocar e tocar bem, com pegada, com groove, com feeling. Porque tocar bem é uma série de coisas. Não adianta ser só técnico, só rápido ou seja lá o que for. É a química da banda tocando junto, suando como uma máquina de brutalidade. Temos a preocupação de estar sempre praticando instrumentos, ensaiando, mas não rola essa de ser mais rápido ou isso e aquilo. E acima de todos esses fatores, o principal é fazer um disco para o fã escutar e já sair batendo cabeça, curtir todos os riffs, todas as linhas de vocal, para o cara chegar em casa, botar o disco e curtir. Porque tem muita banda nova de death metal, de black, extremo, que fica muito preocupada com o lance de ser brutal e esquece um pouco o feeling. Você escuta um disco que o cara toca mil notas por segundo e no final você não lembra um riff, não consegue curtir, entrar na batida da música. Para nós isso é o principal, fazer um disco de metal para o cara escutar e curtir.

REG: O título desse disco se refere ao Brasil ou ao Rio Grande do Sul, terra natal de vocês?

Max: Não é o fato de sermos do sul do Brasil, mas de o Brasil ser da América do Sul. Eu acho que o fato de sermos brasileiros, do Terceiro Mundo, isso tem uma influência muito forte na nossa música. Foi uma coisa que nos ajudou muito no começo, quando começamos a fazer as primeiras turnês, a aparecer mais lá fora. A galera sempre reconheceu o Krisiun como uma banda que tinha um estilo diferente do Morbid Angel, do Canibal (Corpse), do Deicide, das bandas que já estavam estabelecidas. Nós não viemos copiando ninguém. Essa identidade do Krisiun, que nós podemos chamar de brutal mais sujo, mais agressivo, é uma coisa que tem a ver com o fato de sermos daqui da América do Sul, tem muito disso na nossa música. O Sepultura também tem esse lado. As bandas que vêm daqui sempre vão trazer uma bagagem, uma influência muito forte do país, do continente.

REG: Vocês voltaram a trabalhar com o produtor Andy Classen. É possível variar a sonoridade da banda num novo disco mantendo o produtor?

Max: É possível. Por exemplo: o “Assassination” nós gravamos com ele, e voltamos nesse porque gostamos muito dessa produção. Muitas vezes, nos discos anteriores, nós não ficamos satisfeitos com a produção, e isso é uma busca que nunca termina, a banda sempre está procurando uma produção melhor. Às vezes achamos que ficou legal e no final não ficou tudo aquilo. Com o Andy Classen nós acertamos, ele conseguiu um balanço muito bom entre uma produção que tem peso, e o som é extremamente natural, pesado, um som “gordo”, mas bem claro ao mesmo tempo. Ele consegue um equilíbrio entre o moderno e o “old school”. Com ele acho que finalmente achamos uma produção ideal. Mas no “Southern Storm” nós buscamos algo parecido com o “Assassination”, ser mais pesados ainda, melhorar certos aspectos que deixaram a desejar, tanto nas composições como na produção. Tentamos vir com um disco mais pesado e uma produção com os instrumentos mais “na cara”, mais garra, a bateria mais natural ainda, tribal.

REG: “Minotaur” é uma música que tem um clima sombrio; como ela foi feita e sobre o que fala?

Max: A letra dela é a menos realista do disco. A maioria das letras é inspirada na realidade, em guerras, genocídios. Tudo que a gente vê de ruim, violento e sanguinário influencia nossas letras. Já “Minotaur” é uma coisa inspirada na mitologia, no minotauro, que é metade homem, metade besta. Foi uma coisa que se encaixou legal no ritmo da música, na estrutura toda. A composição partiu daquela batida tribal em que ela começa, na bateria, que um dia eu fiz, brincando no estúdio, e o Moyses falou: “toca isso aí que nós vamos fazer uma música em cima desse negócio”. Como eu falei, as coisas fluem naturalmente, e decidimos fazer uma música em cimas desse ritmo tribal, com um som um pouco mais lento.

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Tentamos vir com um disco mais pesado e uma produção com os instrumentos mais “na cara”

REG: Você falou que nesse disco as músicas mais rápidas são mais rápidas ainda. Uma delas é “Under The Sun”, que tem partes velozes demais…

Max: Essa música varia bastante, vai de uma coisa mais lenta para outra mais rápida…

REG: Isso tem a ver com o encaixe das letras?

Max: Não tem muito a ver o conteúdo das letras com o ritmo da música, é mais o clima que a música passa. O lance de ser mais rápida não influi muito. A gente se liga é na atmosfera da música.

REG: Em geral a música vem antes?

Max: Primeiro vem a música, mas nisso o Alex vai escrevendo, na medida em que a gente começa a compor ele vai tendo as idéias para as letras se encaixarem legal na composição. Para esse disco o Alex escreveu tudo. No passado o Moyses escrevia, todo mundo escreve alguma coisa. Dessa vez foi o Alex que ficou mais focado nas letras.

REG: Vocês costumam gravar covers. Por que dessa vez escolheram Sepultura e por que a música “Refuse/Resist”?

Max: O Sepultura foi a banda que mais nos influenciou, não só na música, mas na atitude, em todos os aspectos. O Sepultura é uma banda que foi lá e mostrou o Brasil para o mundo inteiro, o metal brasileiro. Mostrou que se você acredita, se batalha, consegue as coisas, por mais difíceis que sejam. Para ter uma banda no Terceiro Mundo, no Brasil, e chegar junto com os caras lá fora, sempre vai ter barreiras e essas barreiras podem ser quebradas. Então o Sepultura mostrou tudo isso pra nós, mostrou que existe um caminho, basta lutar muito e acreditar na parada.

REG: E a música, esperava-se alguma coisa de uma fase mais antiga…

Max: Essa foi uma das razões, a vontade de fazer um negócio diferente. Com certeza a galera estava esperando alguma coisa do “Schizophrenia” ou do “Beneath The Remains”, mas achamos que seria mais interessante ver o Krisiun tocando um som mais lento do Sepultura do que uma coisa mais rápida, mais óbvia. Escolhemos essa pra ficar um negócio diferenciado mesmo. E além de tudo é um puta som, tem muita raiva, é um som raivoso.

REG: Vocês já pensaram em colocar outros instrumentos na banda, ao menos na hora de gravar, no estúdio?

Max: Lógico, algum coisa assim pode até acontecer no futuro. Um guitarrista, de repente fazer um duelo com o Moyses, violão ou alguma coisa assim. Mas nunca fugindo muito da proposta da banda. Uma coisa ou outra, uma introdução, ou no meio da música, uma coisa que tenha a ver. Mas também não vamos encher um disco de teclados ou coisas do tipo. Sempre vai ser o que é, mas eventualmente pode acontecer de ter a participação de alguém, um amigo músico que possa fazer alguma coisa.

REG: Vocês continuam tocando muito na Europa, mas, e nos Estados Unidos, vocês fizeram um bom caminho lá também?

Max: Na verdade, no “Assassination” nós fizemos muito mais shows nos Estados Unidos. Entre o começo de 2006 e o começo de 2007, fizemos três turnês nos Estados Unidos e Canadá que deram mais de 100 shows. Nos Estados Unidos a coisa tá de igual pra igual com a Europa, em termos de shows e turnês. A aceitação da banda lá é muito boa.

REG: Tem mais público lá ou é igual na Europa?

Max: Se comparar país por país certamente os Estados Unidos é o mais forte, a gente consegue fazer, numa turnê, uns 70 shows. Já na Europa faz 15 na Alemanha, meia dúzia na França… Mas se for fazer a comparação Europa com Estados Unidos, é mais ou menos igual.

REG: Os locais são parecidos?

Max: Varia muito o país. Nos Estados Unidos sempre tem os shows que são os picos, como em Los Angeles, Nova Iorque, em Seattle. No Texas os shows são muito bons, mas tem os shows menores, em cidades menores, em clubes, com menos gente. É bem diferente de uma cidade pra outra.

REG: Em que lugar do mundo o Krisiun ainda não tocou e vocês querem muito tocar?

Max: Tem vários. Na Ásia tá abrindo um caminho, tem a China, o Behemoth vai fazer a primeira turnê na Ásia. Temos vontade e curiosidade de ir para esses lugares, levar o metal extremo pra eles. Austrália também nunca rolou, provavelmente vai rolar com o disco novo.

REG: Vocês se mantêm ligados com o que rola no mundo do metal… Já ouviram o novo do Metallica?

Max: Achei legal pra caralho, um puta disco, fiquei surpreendido. Não esperava que eles viessem nessa linha mais thrashão mesmo, thrash de verdade. Eles fizeram tanta coisa ruim que saíram totalmente da proposta inicial da banda. Agora acho que eles se reencontraram, estão fazendo o que eles sabem fazer de melhor. Eu achei o disco muito bom.

REG: Vocês liberaram músicas na internet antes de o CD sair. Como vocês estão lidando com essas mudanças no mercado do disco? E afinal, internet é bom ou ruim?

Max: É meio complicado esse negócio de internet, porque depende muito do indivíduo em si. Eu já vi cada coisa na internet, coisas ridículas. Os caras entrando em sites da banda, chats e coisas assim, e o próprio fã colocando o disco inteiro para baixar e uma porrada de gente baixando. São pessoas que não vão comprar o disco. E, no entanto, tem pessoas que são fãs de verdade e ficam procurando na internet por curiosidade de escutar o disco. Eu faço isso. Sai um disco novo de uma banda que eu gosto, eu procuro e tento escutar. Se eu gostar, compro depois. O cara que é fã de verdade procura na internet porque não agüenta de ansiedade para escutar o trampo novo, mas depois ele vai comprar. E tem os parasitas, que não compram CD de ninguém e ainda ficam falando mal. A galera que se preocupa em apoiar a banda consegue manter a coisa andando.

REG: A grande característica do Krisiun sempre foi a agressividade, mas, um dia, com o passar do tempo, até pela idade, vocês vão acabar cansando disso. Como você vê o futuro do Krisiun nesse sentido? Vocês vão ficar tocando esse som porrada pra sempre?

Max: A intenção é a de ser sempre agressivo. No momento em que não tiver mais o pique, a vontade de fazer um som agressivo, a gente aposenta a banda. Se for pra fazer um Krisiun mais light, diminuir a agressividade, a brutalidade das músicas, é melhor cada um partir pra outra coisa. Tocar num boteco, fazer alguma coisa assim.

REG: Você não imagina o Krisun como os Stones, velhos e tocando a mesma coisa?

Max: Não, não rola. O estilo que a gente toca é mais físico, tem que estar com um bom preparo. Só que tem coisas que surpreendem. Por exemplo, antigamente neguinho falava que o Morbid Angel não iria agüentar, e já passou um tempão, os caras com mais de 45 e ainda estão detonando. E também, na história da música tem casos que nem o de um baterista chamado Buddie Ritchie. Ele é um grande ícone da bateria, um cara genial, era um baterista de jazz, mas era o cara mais brutal e agressivo que os outros, tinha muita selvageria quando tocava, destruía o instrumento. Ele morreu no meio dos anos 80, já estava com quase 70 anos, e quando estava aquecido destruía do mesmo jeito de quando ele tinha 20. Tem casos que vai além do físico, é um lance mais espiritual, da selvageria que o cara tem dento dele que continua guiando a forma como ele vai tocar. Tem muito cara que chega numa certa idade, grava dois, três disquinhos e já começa a amansar, por preguiça de praticar o instrumento. A que ponto nós vamos conseguir chegar só o futuro dirá, mas enquanto estivermos com vontade, vamos embora. Mas vai demorar, ainda vamos incomodar bastante.

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Se for pra fazer um Krisiun mais light, diminuir a agressividade, a brutalidade das músicas, é melhor cada um partir pra outra coisa

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3 Comments

  1. Muito legal a entrevista, fiquei na estiga pra escutar esse novo album, ate porque faz tempo que nao curto o som deles justamente por achar repetitivo.
    Mas pelo que li parece que esta bem interessante esse novo album.

    AH…

    Que fotos FODAS essa hein!.

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